Apesar das declarações de representantes do Poder Judiciário repudiando a circulação de fake news desde as eleições de 2018, o aparato técnico e jurídico da Justiça brasileira não acompanhou as ferramentas “muito poderosas” criadas pela “máquina da desinformação”. A avaliação é de Leandro Tessler, do Grupo de Estudos da Desinformação em Redes Sociais (EDReS) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Para o pesquisador, a avalanche de desinformação em 2022 será ainda pior do que a observada em 2018.
“Primeiro porque existem algoritmos novos, as chamadas redes que competem, de inteligência artificial, que são alimentadas. Uma rede cria algo falso e pede para outra rede identificar. Nesse pingue-pongue, é possível gerar rostos, textos e vozes falsos, que parecem muito verdadeiro. Essas redes são alimentadas com várias imagens e vozes de políticos, fazendo com que seja possível rapidamente emular falas por políticos. Nós definimos isso como deep fake”, explica. Isso representa a profissionalização dos grupos que produzem e espalham conteúdos falsos.
“Vem aí uma avalanche de desinformação”, afirma Tessler. “O Brasil vai precisar estar muito bem equipado, financiado e preparado juridicamente. Precisa haver um consenso nacional de que desinformação é muito nocivo pra sociedade e que é necessário tomar medidas duras e práticas pra impedir a disseminação. Se isso não for feito, nós temos muitas chances de ter uma eleição, senão decidida, pelo menos muito influenciada por desinformação”.
Justiça Eleitoral
Para Tessler, embora as campanhas contra a desinformação realizadas até o momento pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ressaltem a “credibilidade da Justiça Eleitoral, a segurança, auditabilidade e a transparência do sistema de votação”, tais ações ainda são insuficientes para frear a onda de mentiras que está por vir.
“O Brasil é muito lento para reagir à difusão de desinformação. Quem mais tenta segurar a desinformação são as empresas donas das redes sociais muito mais do que a Justiça brasileira”, afirma.
Para o pesquisador, a Justiça Eleitoral não possui um “instrumento legal ágil” para combater a desinformação. “O discurso do STF [Supremo Tribunal Federal] e do TSE são muito mais tomadas de posição do que prático. Eu tenho dúvida se existem as ferramentas corretas para isso. Então eu fico imaginando que vai ser muito pior. Em 2018, o que segurou os disparos mais ou menos foram as empresas. Então a gente tem que confiar muito mais nas empresas do que na Justiça. E tem empresas que não querem ou não vão colaborar, essas redes de extrema-direita. O próprio Telegram tem se mostrado muito averso a colaborar”.
Ascensão do TikTok
Leandro Tessler não tem dúvida de que a plataforma TikTok será utilizada para a divulgação de informações falsas nas eleições brasileiras de forma massiva, especialmente porque atinge uma faixa etária “muito jovem”, que procura referências políticas e ideológicas para formar um posicionamento.
Um estudo do grupo de monitoramento de mídia Media Matters for America, divulgado ainda em março do ano passado, mostrou que a plataforma de vídeos TikTok estava direcionando os usuários para conteúdos relacionados à extrema-direita nos Estados Unidos. Mais recentemente, o grupo informou que os algoritmos da plataforma estão permitindo a disseminação de desinformação em meio à invasão russa ao território ucraniano.
Ascensão do Gettr
Outra rede que está em ascensão no Brasil é o Gettr, lançada por membros da equipe do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e que está se popularizando entre a extrema-direita brasileira. Tessler afirma que a plataforma não tem nenhum tipo de regulamentação, abrindo espaço para qualquer tipo de publicação, “em nome da liberdade de expressão”.
Dias depois de a plataforma ter sido lançada, o presidente Jair Bolsonaro e seus apoiadores criaram perfis na rede, a exemplo dos filhos Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) e Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), além dos apoiadores Carla Zambelli (PSL-SP), Paulo Eduardo Martins (PSC-PR), o ministro Fábio Faria (Comunicações) e o blogueiro Allan dos Santos. Flávio Bolsonaro caracterizou a Gettr como “mais uma rede em defesa da liberdade” ao anunciar o seu perfil aos seguidores do Twitter.
Na era digital, a campanha eleitoral transcendeu os tradicionais comícios e panfletagens, encontrando no vasto mundo da internet um palco sem precedentes para o debate e a disseminação de ideias. No entanto, esse novo território vem acompanhado de desafios significativos, especialmente no que tange à desinformação. Especialistas, como Leandro Tessler do Grupo de Estudos da Desinformação em Redes Sociais (EDReS) da Unicamp, alertam para a sofisticação da “máquina da desinformação”, equipada com tecnologias capazes de criar conteúdos falsos altamente convincentes, os chamados deep fakes. Estes conteúdos, que muitas vezes assumem a forma de declarações falsas atribuídas a políticos, têm o potencial de influenciar eleições e moldar indevidamente a opinião pública.
A crescente onda de desinformação, impulsionada por plataformas como TikTok e Gettr, evidencia uma realidade inegável: a necessidade de estratégias robustas e adaptadas para combater a disseminação de informações falsas. Neste cenário, a Justiça Eleitoral e suas ferramentas se mostram insuficientes para coibir essa prática, apontando para uma lacuna que precisa ser preenchida com urgência.
Para os candidatos a vereador ou prefeito, a realidade impõe um desafio adicional, mas também uma oportunidade única. A chave para se destacar em um ambiente inundado por informações falsas e propaganda negativa não está apenas em se defender desses ataques, mas em construir uma relação direta, transparente e autêntica com o eleitorado. Aqui reside a importância de uma base de eleitores digital eficaz, que permite aos candidatos comunicarem suas propostas de maneira clara e direta, estabelecendo um canal de comunicação inalterado pela desinformação.
Uma base de eleitores digital não é apenas um recurso; é uma necessidade estratégica para quem deseja navegar com sucesso nas turbulentas águas da política contemporânea. Por meio dela, é possível não apenas apresentar propostas e ideias de maneira íntegra, mas também construir uma comunidade engajada e informada, capaz de discernir entre a verdade e a manipulação. Em um tempo em que a desinformação é uma arma poderosa, armar-se com a verdade e a transparência se torna o caminho mais eficaz para conquistar e, mais importante, manter a confiança do eleitorado.
Portanto, à medida que nos aproximamos de mais um ciclo eleitoral, torna-se evidente que o sucesso de uma campanha não se medirá apenas pela habilidade de combater a desinformação, mas também pela capacidade de criar uma ponte sólida e confiável com os eleitores. Uma base de eleitores digital não é apenas um luxo em tempos de eleições influenciadas pela desinformação; é um investimento indispensável na integridade da democracia e na eficácia da comunicação eleitoral. Para os candidatos que visam não apenas sobreviver, mas prosperar neste novo ambiente, a adoção dessa ferramenta não é apenas estratégica, é essencial.